A interpretação de acordos internacionais frente à complexidade das relações comerciais globais
Em decisão recente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que para usufruir do benefício tributário da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), a mercadoria deve ser transportada diretamente do país exportador para o importador, sem passar por territórios de países não signatários do acordo. Essa decisão trouxe à tona os desafios na interpretação de acordos internacionais no contexto jurídico internacional.
O Regime Geral da ALADI, um produto do Tratado de Montevidéu, busca fomentar o desenvolvimento econômico na América Latina através de acordos comerciais que estabelecem preferências entre seus membros.
Essa interpretação veio à tona diante de uma operação comercial realizada pela Petrobras. A empresa importou combustível da Venezuela para o Brasil, ambos países membros da ALADI. No entanto, o faturamento foi registrado nas Ilhas Cayman, país não integrante da associação, levantando-se assim, controvérsias diante da triangulação comercial realizada.
O pagamento da mercadoria pela subsidiária da Petrobras nas Ilhas Cayman resultou em uma quantia substancial de Imposto de Importação discutida na ação de desconstituição do crédito tributário.
Em primeira instância, o crédito tributário foi anulado, decisão que foi posteriormente confirmada pelo TRF1. O tribunal fundamentou sua decisão destacando que a presença de um certificado de origem comprovando que o combustível importado vinha de um país membro da ALADI e era diretamente despachado para o Brasil, outro país membro, implicaria em um tratamento tributário conforme o acordo internacional, mesmo com o faturamento ocorrendo em um país não integrante da associação.
Em fase recursal, o relator apontou que a certificação de origem está vinculada à fatura comercial, concluindo que a mercadoria não foi enviada diretamente do país exportador para o importador. Assim, determinou que a importação não atendeu aos requisitos do artigo 4º do Regime Geral de Origem da ALADI e que a mercadoria não deveria receber tratamento tributário favorável em relação ao Imposto de Importação. O relator expressou preocupação com a possibilidade de a empresa ter adotado uma estratégia de planejamento tributário agressivo, caso o objetivo fosse evitar o pagamento de impostos sem justificativa legítima. Além disso, ressaltou que uma interpretação ampla pode representar uma ameaça à concorrência e à equidade comercial, ambos elementos cruciais para o desenvolvimento econômico global.
Por fim, a interpretação do STJ indica que, se houver necessidade de trânsito, é crucial justificar a passagem por razões geográficas ou de transporte, e é essencial que não haja divergência nos documentos essenciais para comprovar o direito de usufruir do tratamento tributário pretendido.
Esse caso evidenciou a complexidade das relações comerciais e a importância da interpretação precisa dos acordos internacionais.
Vitória Oliveira Barbosa | Advogada de Di Ciero Advogados